segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Curva à esquerda




Na folha branca de papel faço o meu risco,
Retas e curvas entrelaçadas,
E prossigo atento e tudo arrisco
Na procura das formas desejadas

São templos e palácios soltos pelo ar,
Pássaros alados, o que você quiser.
Mas se os olhar um pouco devagar,
Encontrará, em todos, os encantos da mulher.

Deixo de lado o sonho que sonhava.
A miséria do mundo me revolta.
Quero pouco, muito pouco, quase nada.

A arquitetura que faço não importa.

O que eu quero é a pobreza superada,
A vida mais feliz, a pátria mais amada.


Esse poema, do Niemeyer, me lembra uma questão comumente colocada para os esquerdistas socialmente privilegiados, como artistas e integrantes das classes médias.Que questão é essa? A de que esses esquerdistas são incoerentes.

É um ponto de vista equivocado, pois um esquerdista poderá abrir mão dos benefícios que recebe de sua posição social em prol de sua ideologia:
aquele que pretende apenas reformar o capitalismo poderá aceitar perder renda e riqueza para que quem estiver na base da piramide tenha dignidade. Por exemplo, isso ocorreria com um profissional liberal que aceita e concorda em ser mais tributado para que os serviços públicos sejam financiados;
aquele que pretende substitui-lo pelo socialismo poderá aceitar - partindo de uma visão simplista do socialismo - ter o mesmo que os demais trabalhadores. A exemplo de Che, que abandonou a sua vida de classe média por seu ideal socialista.

Claro que, em ambos os casos, pode haver um incoerente. Há exemplos deles na história do socialismo real, como os burocratas de países comunistas que viviam com privilégios. Porém, essa incoerência não ocorre necessariamente, como já demonstrado. Isso basta para que esse senso comum sobre a esquerda não seja, a priori, verdade.

Niemeyer era, felizmente, um coerente,

A arquitetura que faço não importa.
O que eu quero é a pobreza superada,
A vida mais feliz, a pátria mais amada.